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Fabriqueta de pensamentos – por Márcio Grings

Talvez ele esteja se movimentando pro lado errado. Quando pisa no chão, os pés parecem que estão atravessando uma nuvem. Teve essa sensação ainda há pouco. Suas costas dão sinais de cansaço. Deve ser um tipo de penalidade por suportar o peso de uma mente desproporcional em matutar demais. Provavelmente essa fabriqueta de pensamentos amontoa muita coisa dentro de um espaço reduzido. Ele sempre planeja demais e isso terminantemente acaba frustrando grande parte das expectativas.

márcioLembra das flores de plástico na casa da avó. Seria uma vitória ressuscitálas. Livros de cânticos em alemão com tipografia desenhada e páginas com cheiro de uma antiguidade ancestral. Lembra da louça do início do século XX, parte dela enterrada como entulho no fundo do pátio da mãe. Cemitério da infância. Sopa de galinha caipira com salsa saltando pra fora do prato. Pão com banha e açúcar. Ovos fritos com gema de um amarelo diferente e café com leite gorduroso às cinco da manhã. As compotas de pêssego com aramados na tampa brilhando na cristaleira. Os traços incorruptíveis do sol da manhã se digladiando com o mofo impregnado.

Essa sensação de se estar se movimentando pro lado errado o acompanha. Como se soubesse que é necessário nos precavermos de uma decepção iminente.  A droga da fabriqueta não para de trabalhar. Vai produzindo uma pá de pensamentos e jogando tudo dentro daquele pobre diabo. É como excesso de chuva num lago artificial. Essa droga vai transbordar. Quem não sabe disso?

Escreve uma frase qualquer no verso de um papel extraído numa carteira de cigarros vazia. De um lado a textura facilita à escrita. No outro, o papel prateado não permite que se rabisque coisa alguma. Cheira a embalagem interna e a aspira. Aroma familiar. Cigarro apagado tem um ranço agradável de fumo e ingredientes cancerígenos.

Não dorme de uma forma ininterrupta faz alguns dias. Por isso os olhos vermelhos e a cara de quem tá sempre tirando areia dos olhos. Certamente está se movimentando pro lado oposto. Como uma peça de xadrez ziguezagueando na mão de um jogador ruim. Todo mundo sabe o final.  Ou talvez não.

Olha pro lado e não entende uma boa parte dos caminhos propostos. “Alguém deve tá de sacanagem”, pensa alto. Anda estudando como cultivar cogumelos comestíveis e ainda não descobriu uma forma de vencer as formigas destruidoras de plantas. À noite, ouve insetos gigantes gargalhando dele.

E a fumaça produzida por um fumante imaginário é como uma teia de aranha se movimentando elegantemente pelo ar. Por isso, nunca se esqueça: “os insetos sempre têm razão”.  Eu sei por que as moscas estão de proliferando. Alguém está liquidando as aranhas papa-moscas. E por isso elas se materializam em baforadas de nicotina. Espíritos aracnídeos.

 

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