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Tumor leste – por Orlando Fonseca

Há certas palavras que não fogem à fatalidade de sua designação. Mesmo que se pretendesse, como é próprio dos eufemismos, “dourar a pílula”, quando o remédio é amargo fica difícil de engolir. Esta é a conclusão do meu amigo Raul Maxwell, ao comentar a possível incongruência – que a ele é definitiva – quando se trata do termo tumor.

Estávamos de alma leve, como soe acontecer às quartas-feiras, quando nos reunimos no Ponto de Cinema, e a conversa girava em torno da saúde de um dos nossos amigos. Em seu comentário resistia uma impressão de contradição, pois como é que algo desse jaez pode ser benigno? Sendo o que é, no anúncio pressago de suas duas sílabas, cujas vogais fechadas e a sequência de consoantes não deixam dúvida, só pode ser associado à sua sanha maligna.

Meu amigo Raul é mestre no jogo de palavras. Assim como o poeta Mario Quintana, para o qual, assustador nos monstros é a sua própria designação monstruosa. A palavra “seborreia”, para outro especialista, o Verissimo, cai direto no chão, pois não tem asas como a palavra “sílfide”. Daí me ocorre que, voltando-nos para a realidade nacional, a designação de eventos trágicos da nossa história tem lá os mesmos problemas de ordem lexical.

Chamar de Independência o que significou aquele grito de D. Pedro I, às margens do riacho Ipiranga, e ainda querer dar a ele a nobreza de um épico “brado retumbante” é muito cabotinismo. Admitir que o fim do império e o começo da República foi o resultado de uma quartelada em 1889 é superdimensionar nossas idiossincrasias.

Dizer que o golpe civil militar de 1964 foi uma revolução – redentora, gloriosa – não resolve em nada tudo o que de atraso significou ao país. Mas há os que insistem em sua eficácia e, não contentes com as sequelas deixadas de herança genética às futuras gerações – ainda sentimos seus efeitos – querem dizer que aquele tumor foi benigno no tecido social tupiniquim. Assim como os outros eventos históricos mencionados poderiam fazer bem à soberania da esquálida fisiologia republicana.

Nos dias atuais, chamar o golpe em curso de outra coisa é uma maneira de dissimular o rubor nas faces dos que bateram panela, levantaram faixas contra a presidente, e pensaram estar extirpando um tumor maligno, quando justamente o estavam alimentando. Basta ver os últimos boletins sobre a saúde da economia, da ordem social e moral do Brasil. E o mais difícil de constatar nesta seara é que não há fenômenos benignos. Aliás desde que o chanceler alemão Otto von Bismarck sentenciou que os “cidadãos não poderiam dormir tranquilos se soubessem como são feitas as leis e as salsichas” é que se entende ser a democracia um regime típico e similar às terapias radicais, quando se pretende curar os males graves da vida republicana.

Especialista em trocadilhos, meu amigo Raul poderia tentar outros qualificativos para o termo, já que é impossível retirar dele a sua fatalidade. Até tentamos pensar em um meio-termo com um “tumor indiferente”, ou coluna do meio, mas parece que não funciona. Poderíamos tentar com números – positivos ou negativos -, ou ainda uma solução, digamos, geográfica, usando o recurso típico das palavras parônimas, no caso a similaridade sonora com um país, e chamá-los de Tumor Leste e Tumor Oeste – aí restando aos especialistas a gradação de periculosidade. Como se vê, não é fácil lidar com os golpes da realidade e suas designações, restando-nos apenas a possibilidade – sedativa – de rir de tudo isso.

DE FATOS E DIVERSÕES

– Como não considerar que o atual governo federal assumiu através de um golpe – não contra um partido ou pessoa, mas contra os cidadãos brasileiros mais necessitados? Basta conferir o gráfico (divulgado em matéria da Veja, 5-7-2017): olhe bem os anos em que a desigualdade entre os mais ricos e os mais pobres vinha em queda livre, e como se encontra agora, um ano do governo ilegítimo de Temer.

– O advogado de Temer, na tentativa de defendê-lo da denúncia de corrupção passiva, declarou que “a voz das ruas não deve ser ouvida nos tribunais”. Além de pretender desqualificar o áudio com a voz do Joesley Batista na gravação, o causídico quer desqualificar o áudio da vida democrática e republicana.

– O IPCA de junho apresentou uma deflação de 0,23%, segundo dados do IBGE. Para se ter uma ideia da queda, o resultado é o mais baixo desde início do Plano Real. Pra se ter uma noção melhor do tamanho do fundo do poço, este é o pior dos mundos para os economistas: deflação com recessão. A notícia, que poderia ser um alento é que o abacate lidera a lista de baixas, só que é o abacaxi aquele que apresenta o verdadeiro índice do Plano Surreal que vive o país: o custo que vai levar para descascá-lo é que é o grande pepino. E o povo? Que vá plantar batatas.

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