Coluna

Um rosto humano – por Bianca Zasso

O que você espera de um documentário? O mais comum é que sejamos apresentados a uma história ou a um personagem pelo olhar de quem a conheceu ou mesmo pelo seu autor. Sejam em formatos mais tradicionais ou brincando com a ficção, documentários costumam ser aulas de história extremamente divertidas, não importa se quem está no centro das falas é um grande político ou a senhorinha que mora na velha casa da esquina.

Documentar é registrar histórias e ser espectador de documentário exige aquela paixão por gente que alguns jornalistas, artistas e escritores costumam ter. A belga Agnès Varda, uma das mais importantes cineastas do moderno cinema francês, do alto dos seus 89 anos, deu ao mundo talvez o mais divertido documentário dos últimos anos com o seu Visages, Villages.

Dividindo a direção e o protagonismo do filme com o fotógrafo francês JR, Varda passeia a bordo de um carro que também é uma cabine fotográfica que imprime fotos gigantes. O objetivo é colar as imagens em casas, galpões, containers e até bunkers abandonados de cidades do interior.

Isso é o que descobrimos em um primeiro e distraído olhar. Os rostos de pessoas comuns e animais transformados em arte cuja moldura são tijolos, madeira e ferro do cotidiano foi o modo encontrado por Varda e JR para falar sobre a força das imagens e em como a arte pode estar em qualquer lugar e ser admirada de várias formas. Nem certas, nem erradas, mas únicas.

Visages, Villages tem inúmeras referências imagéticas e cinematográficas e o carisma de Varda só aumenta quando ela é provocada por JR e seus inseparáveis óculos escuros. É impossível não se emocionar ao ver a cineasta chorando por conta de uma piada de mau gosto dita por Jean-Luc Godard, um amigo do qual ela conhece muito bem os defeitos.

Vê-la questionando as escolhas de JR e lhe propondo novas perspectivas para sua arte são uma amostra de que criatividade e reinvenção devem ser uma constante em nossas vidas. A cada novo local, os olhos de Varda, mesmo com os problemas causados por uma doença, brilham como os de uma criança descobrindo um novo brinquedo.

Conversa com as pessoas com uma vitalidade de dar inveja e, mesmo que tenhamos a sensação de que ela já viveu de tudo e já criou quase tudo, ainda há a novidade, a dúvida sobre qual foto ampliar e a felicidade de perceber ângulos que passaram despercebidos quando ela era apenas uma jovem fotógrafa.

Não importa o que você espera de um documentário. O importante é o que ele vai te oferecer e as gratas surpresas que podem iluminar o seu dia. Visages, Villages é um filme carinhoso, um passeio leve acompanhado de conversas que tocam nossas retinas e nossas almas.

É lindo ver uma cabra ou um peixe enorme em uma parede. Transforma nossa maneira de ver o mundo. Mas John Ford tinha razão quando dizia que um rosto humano era a coisa mais maravilhosa do mundo para se filmar. Uma câmera sempre precisa de um olhar para ter sentido.

Visages, Villages

Ano: 2018

Direção: Agnès Varda e JR

Disponível em DVD e Blu-Ray

Artigos relacionados

ATENÇÃO


1) Sua opinião é importante. Opine! Mas, atenção: respeite as opiniões dos outros, quaisquer que sejam.

2) Fique no tema proposto pelo post, e argumente em torno dele.

3) Ofensas são terminantemente proibidas. Inclusive em relação aos autores do texto comentado, o que inclui o editor.

4) Não se utilize de letras maiúsculas (CAIXA ALTA). No mundo virtual, isso é grito. E grito não é argumento. Nunca.

5) Não esqueça: você tem responsabilidade legal pelo que escrever. Mesmo anônimo (o que o editor aceita), seu IP é identificado. E, portanto, uma ordem JUDICIAL pode obrigar o editor a divulgá-lo. Assim, comentários considerados inadequados serão vetados.


OBSERVAÇÃO FINAL:


A CP & S Comunicações Ltda é a proprietária do site. É uma empresa privada. Não é, portanto, concessão pública e, assim, tem direito legal e absoluto para aceitar ou rejeitar comentários.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo