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Cobertores melodramáticos – por Bianca Zasso

Nos anos 80, com a popularização dos videocassetes, as pessoas descobriram que não há nada mais aconchegante do assistir a um filme no conforto do lar, embaixo das cobertas. A tal modernidade não exigia mais que saíssemos de casa para desfrutar de uma boa história. Como o frio já deu as caras em Santa Maria e muita gente já está planejando o estoque de Sétima Arte para as noites congelantes, a colunista aqui quer fazer uma proposta: que tal colocar na lista alguns melodramas?

Na década de 40, o melodrama foi um dos gêneros mais populares no cinema hollywoodiano. Histórias sofridas, quase sempre com protagonistas femininas, lotavam os cinemas e rendiam algumas lágrimas do público. Como na maioria das vezes o choro era provocado por dores de amor, o melodrama ganhou fama de filme de mulherzinha por alguns machões da época. Ironia da vida, quem criou alguns dos melhores exemplares do gênero foi um homem.

O diretor Douglas Sirk sabia conduzir tramas sobre famílias cheias de segredos, garotas suspeitas e homens galanteadores e perigosos. Imitação da Vida e Tudo que o céu permite são duas produções extremamente melodramáticas, que tratam da cultura das aparências nos subúrbios americanos e o conflito de gerações. Muito antes de Mike Nichols encantar o mundo com a relação entre um jovem e uma mulher madura em A primeira noite de um homem, Sirk já mostrava uma atração fatal entre uma dona de casa oprimida e um jardineiro com a mesma idade de seus filhos.

Mesmo que Douglas Sirk tenha sido o grande nome do melodrama no cinema, Michael Curtiz foi o responsável por um dos mais devastadores filmes sobre a relação mãe e filha. Alma em Suplício, inspirado no romance do autor noir James M. Cain, apresenta Joan Crawford como Mildred, uma garçonete que decide largar o emprego para investir no próprio negócio, causando vergonha para a filha mais velha, Veda, uma adolescente de aparência angelical e atitudes bem diabólicas.

Quando Mildred resolve recomeçar sua vida amorosa ao lado do golpista Monty, interpretado por Zachary Scott, a primogênita acentua sua raiva e seus planos para mudar de vida ganham ares nada lícitos. Mildred, que sempre fez as vontades de Veda, está à beira do precipício. Sofrer parece ser o seu destino num dos melhores filmes do diretor de Casablanca.

Originado do teatro, o termo melodrama nasceu para designar a junção de música e drama para aumentar a intensidade emocional das situações vividas pelos personagens. Apesar de passar a designar um gênero de alto grau de dramaticidade, porém muitas vezes não se valendo do uso da música, podemos encontrar melodramas bem longe dos anos 40. Pedro Almodóvar é o primeiro nome que surge, já que declarou em várias entrevistas ser um fã confesso de Douglas Sirk.

Os melodramas do espanhol, que no início de sua carreira eram caóticos e chocantes, ganharam um toque sofisticado a partir do final dos anos 90, com filmes como Tudo sobre minha mãe. A tão criticada e discutida comédia romântica, que dominou o mercado americano a partir da década de 90, também deve suas bases ao melodrama. Só que o que antes eram doses pesadas de traições e perdas, tornaram-se romances doces e situações engraçadas.

E as influências não param por aí. A série Mildred Pierce, estrelada por Kate Winslet e dirigida pelo cineasta Todd Haynes, é inspirada no filme de Curtiz e vai além: acentua ainda mais a carga dramática, conseguindo a proeza de ser mais dolorida e sarcástica. Até a clássica personagem Maria de Fátima, da novela Vale Tudo deve sua maldade ao filme.

Dramáticos ou não, o inverno está chegando e precisamos de filmes para não transformar o frio em tédio. Loque um melodrama, pegue um café e cubra-se.  Sem drama.

Alma em suplício (Mildred Pierce)

Ano: 1945

Direção: Michael Curtiz

Disponível em DVD e Blu-Ray

 

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