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A “descomercialização” de Santa Maria (2) – por Carlos Costabeber

Dando sequência ao artigo anterior, segue de forma sintética, a análise acadêmica que realizei no passado, sobre as razões que levaram as empresas do comércio local a sucumbirem no decorrer dos anos.

(1) FALTA DE SUCESSORES. Realmente a minha geração (filhos de comerciantes), não queria saber dos negócios da família. Com a chegada da Universidade, a gurizada preferia fazer Medicina, Engenharia, Odontologia, Direito e Farmácia. Todos os meus colegas sonhavam em “ser doutores”, e isso contagiou os filhos dos comerciantes, que não admitiam “continuar atrás do balcão”, como os seus pais. Aliás, numa das empresas citadas no artigo anterior, havia 12 jovens sucessores, mas nenhum desejou continuar o negócio da família. Um bom exemplo!

Assim, apenas o Augusto Manica, o Rafael Isaia e eu, daquela geração, decidimos estudar (Direito e Administração) para assumir as empresas dos pais.

Dessa maneira, por falta de quem desse continuidade nos negócios das famílias, gradualmente os comerciantes preferiram se aposentar e fechar em definitivo as portas.

(2) ZONA DE CONFORTO: Na época, a concorrência era pequena, as margens de lucro muito altas, a demanda era crescente e o crediário começava a facilitar a vida dos lojistas e dos compradores (o tempo das “duplicatas”).

Santa Maria vivia uma euforia muito grande, com a instalação da UFSM e a chegada de novos quartéis e da Base Aérea. Então, o que se ouvia entre os comerciantes era que a cidade tinha “13 safras” todos os anos (os 13 salários do funcionalismo público e militares). Então, por que se preocupar???

Essa zona de conforto teve sérias consequências, pois eles “pararam no tempo”, abrindo espaço para a concorrência que estava chegando a cidade.

(3) ADMINISTRAÇÃO À MODA ANTIGA: Lembro que quando era estudante de Administração (1967 a 1970), cuidava do “marketing” do Empório Doméstico. Comecei a usar a propaganda nas rádios e na TV Imembuí, decorava a loja nos períodos promocionais, orientava o arranjo das vitrines, da iluminação e da exposição dos produtos, e até da remuneração variável e dos uniformes das vendedoras. Adorava fazer isso, aplicando os conhecimentos aprendidos em sala de aula!

Enquanto isso,  a exceção da Eny Calçados, que sempre esteve a frente do seu tempo, as demais lojas continuavam sendo administradas como na época da caderneta de compras. O atendimento aos clientes era amador, enquanto os novos concorrentes vinham com uma gestão profissional de seus recursos humanos.

(4) A DEPENDÊNCIA DOS “VIAJANTES”: A minha mãe passava o dia inteiro atendendo aos vendedores-viajantes. Ela sempre foi “uma mãe” para eles, orientando e recebendo a todos com carinho e consideração.
Mas ela nunca deixou de viajar frequentemente para comprar nos atacados de São Paulo e Porto Alegre. Essa agilidade nas compras sempre colocou o Empório na frente. Graças às compras ágeis e bem feitas, conseguíamos fazer promoções que atraiam e fidelizavam cada vez mais a clientela.

Enquanto isso, a maioria ficava aguardando a chegada dos viajantes, fazendo com que o processo entre a compra e a venda se tornasse por demais longo e inadequado.

Poderia me alongar ainda mais nesse assunto fascinante, pois pude testemunhar quase tudo o que aconteceu naquela época. É uma história muito linda por um lado, mas igualmente triste, pelo desaparecimento de toda uma geração de lojistas – que na época, viviam e trabalhavam numa verdadeira irmandade.

Por fim, fica minha homenagem a Salvador Isaia, que foi o maior visionário daquele tempo, tendo construído um pequeno império sediado em Santa Maria. Ele foi uma referência na indústria calçadista do Brasil, tendo deixado um legado extraordinário para todos nós.

Quero deixar também meu saudoso agradecimento aos comerciantes que já se foram ou que ainda estão presentes em nosso meio, e que me acolheram ainda tão jovem no seio do movimento lojista: Rui Ramos, Achiles Segala, Angelo Rizzato, Pedro Saccol, os irmãos Stoever e Ugalde, Paulo Rubens Danesi, Attilio Barin Saccol, Alcides Manica, Mário Gaiger, Attilio Fabrin, Fernando Binato, Fernando Roth, Thomaz Vieira de Castro (o conhecido “irmão”), entre outros.

Eu era o “guri” da turma, o “aluno” atento, já que na época tinha  idade para ser filho de todos eles.

Aquela turma da “velha guarda” foi responsável pelo meu aprendizado, tanto na lida do comércio, como na ética do varejo.

Tenham uma boa semana, com mais um resgate da história econômica de nossa cidade.

 

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