Coluna

O riso de uniforme – por Bianca Zasso

Conseguir arrancar lágrimas do espectador é fácil. Afinal, somos humanos e, mesmo em fases nem tão sensíveis da vida, não resistimos a um drama, seja tratando de amor mal resolvido ou doenças raras. Quando o assunto é fazer rir, o buraco é mais embaixo. Poucos diretores entenderam isso como Ernst Lubitsch.

Nascido em Berlim e tendo iniciado sua carreira ainda no período mudo do cinema, o cineasta criou alguma das comédias mais dúbias, elegantes e divertidas das décadas de 30 e 40. Parecem datas muito distantes do nosso tempo, mas um dos ingredientes dos bons filmes é serem atuais, não importa em que ano foram realizados. Lubitsch tem alguns exemplares nesta categoria, como Ser ou não ser, lançado recentemente numa bela edição em DVD no mercado brasileiro.

O título não é à toa. Ser ou não ser remete à Hamlet, de Shakeaspeare, que é um dos textos encenados pelo grupo de teatro polonês que protagoniza o filme. Apesar do destaque nos cartazes de divulgação do longa serem dos nomes de Carole Lombard e Jack Benny, que vivem o casal central, os atores e diretores presentes em cena são quem fazem a história andar, num equilíbrio impecável de elenco.

Durante os ensaios de uma peça sobre nazismo, a Segunda Guerra tem início e, devido ao envolvimento de um jovem piloto com a atriz Maria Tura, o grupo acaba envolvido com um espião disposto a denunciar a resistência polonesa. É o que basta para Lubitsch criar piadas cênicas e tornar um aparente filme de espionagem uma obra que faz rir na medida certa.

O Código Hays imperava nos Estados Unidos e o diretor, que havia chegado na terra do Tio Sam bem antes da invasão de diretores europeus em Hollywood, apresentava os líderes do Terceiro Reich como homens facilmente enganáveis e inseguros, além de temperar o roteiro com diálogos repletos de segundas intenções, o chamado “Toque de Lubitsch”.

Tamanha ousadia não foi compreendida pela crítica e pelo público durante o lançamento. Foi preciso o remédio do tempo, que cura quase tudo, para que Ser ou não ser fosse apreciado em sua totalidade e entrasse para a lista das 100 melhores comédias de todos os tempos, promovida pelo American Film Institute.

Nos extras de Ser ou não ser, há um documentário de quase uma hora sobre a vida e a obra de Lubitsch, tendo como pano de fundo a primeira profissão do cineasta, a de alfaiate. Enquanto críticos e pesquisadores discorrem sobre o perfeccionismo e a criatividade do berlinense que deixou seu nome marcado nos estúdios americanos, acompanhamos a feitura de um terno. Uma bela metáfora para alguém que colocou homens de uniformes imponentes agindo como garotos bobos. Uma roupa de bom corte, assim como o talento de Ernst Lubitsch, sempre cai bem.

Ser ou não ser (To be or not to be)

Ano: 1942

Direção: Ernst Lubitsch

Disponível em DVD pela Obras-Primas do Cinema

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