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Enchentes – por Orlando Fonseca

“Os extremos climáticos indicam que as coisas vão piorar...”

Há um ano, Porto Alegre estava debaixo d’água. O Guaíba havia avançado sobre ruas, tomado praças e assombrado boa parte da população nos espaços residenciais. Em sua jornada até o mar, ameaçava ainda tomar Pelotas, o que veio a acontecer ao longo do mês de maio do ano passado. Ainda que fossem massivas as notícias da Capital, várias cidades no interior do Estado, ao mesmo tempo, simplesmente perderam fatias enormes de seus territórios para o furor das águas.

Desabamentos de morros deixaram cicatrizes ainda visíveis na paisagem, estradas foram interrompidas por enormes crateras e por falta de pontes ou viadutos levados pelas correntes volumosas. Por muito tempo sem algo parecido para que a população tivesse se precavido, mais uma vez o que se viu foi a surpresa da enchente de 1941.

Os tempos são outros, é claro, e o socorro, a solidariedade e a capacidade técnica evitaram o pior no quadro trágico: um maior número de perdas de vida. Mas não é mais possível que ainda se veja a síndrome que ficou conhecida como a dos “abobados da enchente” na Capital. Porque não é o caso de “se” vamos ter outros eventos como esse, e sim “quando”. E para isso é preciso estar preparado desde já.

A partir de agora, os extremos climáticos indicam que as coisas vão piorar em nosso planeta, haja vista a incidência de tragédias com temporais, ciclones, incêndios na região de Los Angeles, EUA, estiagem prolongada no Brasil, no Norte e na região do pantanal, aquecimento das águas dos oceanos, degelo das calotas polares; ainda que de consequências imprevisíveis, são condições climáticas previsíveis.

O Rio Grande do Sul está em uma convergência propícia para esses eventos extremos. Inclusive, a meteorologia está indicando um volume de chuvas expressivo para este mês de maio. O que pode não representar uma condição similar à do ano passado, quando a chuva volumosa veio sobre o terreno encharcado. Mas, de qualquer forma, por ser muita água, em pouco tempo, há riscos de deslocamentos de terreno.

As providências necessárias certamente consomem tempo e recursos, por isso devem ser tomadas de imediato. As cidades, em especial as atingidas pelas cheias, devem passar por um novo traçado urbano, com realocação de condomínios residenciais. A produção agrícola precisa levar em conta o que os ambientalistas alertam há muitos anos: as margens dos rios devem ser respeitadas; é preciso reconstituir as matas ciliares retiradas para dar lugar a plantações extensivas; também é preciso fazer um desassoreamento dos cursos de água.

Em especial em Porto Alegre, os sistemas de contenção precisam de reparos, e devem ser erguidos novos diques, pois o Guaíba, que coleta água de três grandes sistemas hídricos, vai continuar a assombrar a população, toda vez que o belo pôr do sol não puder ser apreciado. A matriz energética deve ser, gradativamente, submetida a uma transição para modelos menos poluentes.

Durante um período longo, em 2024, vivemos aqui no Rio Grande do Sul os efeitos do que se chama hoje de estresse pós-traumático. Felizmente, o tempo e as condições trazidas pelo socorro e pela solidariedade, vieram mitigar aquela condição. Não foi o que aconteceu após a tragédia da enchente de 1941, em Porto Alegre.

Segundo o historiador Sérgio da Costa Franco, a expressão “abobado da enchente” referia-se a gente que perambulava à toa pela cidade, parecendo sofrer de deficiência mental, uma vez que havia perdido tudo na enchente. Virou um provérbio, uma expressão cruel, para indicar quem comete uma tolice.

A isso me refiro, quando digo que não podemos perder a oportunidade de preparar as cidades, precaver as populações, cuidar do ambiente natural, sem se deixar enredar pelo estresse pós-traumático. Pois os extremos climáticos não vão recuar tão cedo, e as consequências já conhecemos muito bem.

(*) Orlando Fonseca é professor titular da UFSM – aposentado, Doutor em Teoria da Literatura e Mestre em Literatura Brasileira. Foi Secretário de Cultura na Prefeitura de Santa Maria e Pró-Reitor de Graduação da UFSM. Escritor, tem vários livros publicados e prêmios literários, entre eles o Adolfo Aizen, da União Brasileira de Escritores, pela novela “Da noite para o dia”.

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3 Comentários

  1. Texto generico sobre generalidades. Vermelhices ficam para a Sala Vermelha do Diario Vermelho onde todo ‘debate’ tem um(a) comissario(a) para fiscalizar. La não tem contradita. Efeito colateral é que se trata de uma bolha. Escolhas editoriais. Não tem que reclamar, se dizem isentões mas são evidentemente majoritariamente vermelhos. Nesta hora vem a afirmação generica ‘também existem conservadores’.

  2. ‘Inclusive, a meteorologia está indicando um volume de chuvas expressivo para este mês de maio.’ Não sei de onde saiu a informação. A seca está grande.

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